quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Insistência

VOCAÇÕES II

De repente eu posso ser um repentista de um repente estilizado que vai do martelo agalopado ao rap aloprado, com seus versos comportados, bem ou mal rimados, mão direita e pé quebrado, porta estreita e portão fechado, aberto às especulações, flagrado na contramão, logrado na boa-fé, escorado ao contrapé, contraposto o argumento, contra o gosto do momento, contraindo matrimônio, contrariando os sonhos, compensando o prejuízo, convertendo os crentes, convergindo os diferentes, diferençando os semelhantes, semeando a discórdia, concordando com a maioria, concorrendo à melhoria, piorando o pior, perigando o perigo, castigando o castigo, conjugando no gerúndio e gerando um caos verbal. Frustrei o meu repente, incompetente, não cheguei sequer ao rap. Raspei de longe uma rima, não pintou nem mesmo o clima de uma peleja nordestina. Fiquei no Pantanal, embrenhado no corixo, acumpliciado aos bichos, acostumado ao bulício de dois jaburus trepando, de uma bandoneona rasqueando na noitada, de um berrante acalentando a boiada, de nada que seja urbano, nem mesmo um interurbano ou um telegrama fonado. Só passado, passível de culpa, possível desculpa, escapando ileso, lesando o legado, aviando a receita, recitando o versículo, versado em versão, avesso a visões, vertendo lágrimas, invertendo resultado, revertendo situação, simulando solução, soluçando despedida, desperdiçando medidas, meditando morte e vida. Quando afinei a inspiração as cordas da viola ainda não haviam acordado. De repente desisti do repente.

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