segunda-feira, 26 de maio de 2008

FUSO HORÁRIO

PACTO COM O FUTURO

“A mudança de fuso horário tem importância do ponto de vista social. Sabemos que o comportamento humano está intimamente ligado ao fenômeno natural comandado pela luz do ciclo solar. Em geral, as atividades humanas são realizadas durante o dia. Então, temos de definir o que é dia. Entende-se como dia o período de tempo compreendido entre a presença da luz ao amanhecer, quando o Sol está a 6 graus abaixo da linha do horizonte, até o pôr-do-sol, quando novamente o Sol está a 6 graus abaixo da linha do horizonte. O projeto de lei prevê para o Estado do Acre e alguns municípios do Amazonas o mesmo que foi feito no Nordeste: um fuso prático. E, no caso do Pará, unificar todo o Estado no fuso de menos 3 horas. Tecnicamente, não vejo qualquer problema, a não ser do ponto de vista social, pois a situação tem de ser avaliada pelas pessoas que lá vivem, que lá praticam suas atividades.”

(Ricardo José de Carvalho, Chefe de Divisão do Serviço da Hora do Observatório Nacional, em depoimento à Comissão de Ciência, Tecnologia e Comunicação da Câmara dos Deputados, 09-02-2007)

O fuso horário foi adotado no Brasil em 1913. Até então cada localidade tinha o seu próprio horário, que era acertado pelo zênite, ou seja, os poucos que tinham relógio na época, punham-se de pé ao meio dia e esperavam o sol a pino. No momento em que a sombra desaparecesse totalmente era meio dia e aí os ponteiros de horas e minutos se juntavam. Era, sem dúvida, o método cientificamente mais correto e seguido sem nenhum transtorno. São Paulo tinha seu próprio horário, Campo Grande o seu e cada lugar com hora diferente, mas como as cidades ficavam muito longe uma das outras e o meio de transporte muito rudimentar, levando dias entre as localidades, as diferenças eram diluídas sem prejuízo.
A partir dessa década o Brasil ganharia velocidade em suas distâncias, com a implantação do telégrafo em todo o seu território nacional e a expansão das ferrovias, principalmente na faixa litorânea. Em 1914, por exemplo, a Noroeste do Brasil completava sua chegada ao Sul de Mato Grosso, ligando Corumbá no extremo Oeste do Estado à cidade de Bauru em São Paulo. Às longínquas e vagarosas viagens aquáticas, somavam-se as locomotivas que logo ocupariam a hegemonia nos meios de transporte. Aí já não havia como continuar cultivando a saudável hora local. Uma viagem entre Corumbá e São Paulo obrigava vários ajustes no relógio e o desconforto mais a confusão dos horários diversos terminariam babelizando as relações entre um lugar e outro.

SUPERANDO DISTÂNCIAS

Aliás, foi exatamente em função do transporte ferroviário à longa distância, nas estradas costa a costa nos Estados Unidos e Canadá, que surgiu a padronização do horário, através de fusos, em meados do século XIX. Significa que o horário está intimamente ligado à velocidade com que se superam as distâncias. Quanto maior a rapidez de se chegar a um determinado lugar, menor a necessidade de diferença de horários entre os lugares. Em agosto de 1914, quando se iniciaram as viagens de trem entre Corumbá e São Paulo, demorava-se mais de uma semana entre uma cidade e outra. Atualmente o trecho de 1100 quilômetros entre aquela capital e Campo Grande faz-se em pouco mais de 12 horas de ônibus e em uma hora de avião de carreira, o que, neste caso, com o fuso em vigor chega-se a São Paulo exatamente na mesma hora em que se saiu de Campo Grande e, na volta, “demora-se” duas horas para chegar a esta capital.
Como se vê, nestes 95 anos, muita coisa mudou em relação ao transporte. Saímos do carro de boi mineiro e das velhas e românticas chalanas para os modernos e velozes aviões a jato e do incipiente telégrafo à conexão pela Internet. O Estado de Mato Grosso foi dividido. O Mato Grosso do Sul despregou-se politicamente do Centro Oeste e passou a integrar à região Sul, como membro efetivo e titular do Codesul, atualmente presidido pelo governador André Puccinelli.

A QUEM INTERESSA

Em verdade, quando o Brasil aderiu à convenção de Greenwich, os fusos foram criados, obedecendo a interesses políticos e econômicos da época. O próprio decreto 2784, de 18 de junho de 1913, que os criou, considera fundamental a adoção do meridiano de Greenwich para as relações contractuaes internacionaes e commercias. Assim sendo, São Paulo que está oficialmente no mesmo fuso de Mato Grosso preferiu juntar-se aos demais estados do litoral, a maioria com uma hora de diferença. Por que¿ Para facilitar as suas transações comerciais com as unidades mais prósperas. Toda a região Sul também está incluída em GMT-4, mas ficou, pelas mesmas razões, com o horário de São Paulo e Nordeste. Não houve, pois, no estabelecimento do fuso horário brasileiro a adoção de um critério técnico ou científico. Prevaleceram os interesses políticos e econômicos dos Estados mais influentes da época. Procurou-se agir com um certo rigor apenas com as regiões isoladas e sem qualquer acesso às decisões mais importantes. O movimento atual é o amadurecimento da classe política e sua compatibilidade com os interesses empresarias do Estado.

SESSENTA ANOS DEPOIS

A primeira vez que se sugeriu alteração o fuso horário de Mato Grosso foi no início da década de 70, portanto, antes da divisão. Coube a um senador do Sul do Estado, Italívio Coelho (Arena) a iniciativa de um projeto de lei, incluindo o território mato-grossense no mesmo horário de Brasília. Á época, por ignorância dos opositores e inconsistência da justificativa para a mudança, a proposta chegou a ser folclorizada e seu autor ridicularizado como “senador do fuso horário.” Faltou aos críticos a mínima noção do que se tratava, cada qual em sua pose de técnico em latitude e longitude, e ao senador melhor embasamento formal, capaz de neutralizar a indiferença de seus pares e o desdém dos “cientistas.” Seus projetos, inclusive um último de 1977, que revisava radicalmente a lei de 1913, que aceitou a convenção de Greenwich, com o final de seu mandato foram todos arquivados. Em 1991, o senador de Mato Grosso, Júlio Campos volta a investir na idéia de unificação do fuso, através do projeto de lei no. 322, rejeitado pelo plenário em 1993.
O assunto permaneceria inativo até 2000, quando o então governador Zeca do PT, num de seus rompantes repentistas resolveu reavê-lo, numa proposta improvisada. A exemplo do Estado do Pantanal, o fuso sofreria bombardeio da oposição e, como não passasse de mais uma presepada do governador, a idéia voltaria ao arquivo, de onde sairia, com extraordinária intensidade política em 2006, pelo projeto de lei 305, do senador Tião Viana, excluindo o 4º fuso e agregando todo o território do Pará (até então dividido entre dois fusos), à hora oficial de Brasília. O relator do projeto na Comissão de Assuntos Econômicos foi o senador Delcídio do Amaral (PT-MS), que deixou passar a oportunidade de incluir Mato Grosso e Mato Grosso do Sul no rol do Pará, já que estes estão na mesma posição geográfica daquele Estado. Alega o senador Amaral que deixou passar, a pedido do autor que pleiteava celeridade na tramitação do projeto, o que não tem nada a ver, por se tratar de substitutivo no âmbito da mesma casa legislativa.
A entrada em vigor da portaria do Ministério da Justiça, compatibilizando horário e faixa etária para os programas de televisão, acicatou o ânimo das redes, principalmente da Globo, que passaram a apoiar movimentos em favor da equiparação de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul à hora legal de Brasília.

UMA SEMENTE

Em Campo Grande é realizada no final de abril, por iniciativa do vereador Athayde Nery de Freitas (PPS) a primeira audiência pública para abordagem do tema. Nascia o movimento Mato Grosso do Sul na Hora Certa, sugerido pela Federação das Indústrias (FIEMS) e encampado pela Associação Comercial de Campo Grande, deputados, vereadores e empresários presentes, entre estes o senador Valter Pereira, que não chegou a assumir uma posição favorável à proposta, mas prometeu estudar sua viabilidade. No dia 6 de maio, o senador Delcídio do Amaral, o mesmo que cochilou no projeto Tião Viana, alia-se ao seu colega Jaime Campos, de Mato Grosso e apresentam o projeto de lei 177, institucionalizando o movimento ressurgido em Campo Grande. O senador Valter Pereira, não estava absolutamente convencido da idéia da mudança, mas mesmo assim, reagiu à iniciativa, acusando-a de plágio e tentando mina-la com a descabida e protelatória proposta de plebiscito.

A OPOSIÇÃO

Em 1913 quando se adotou o fuso horário não foi diferente de hoje. Houve também acirrada oposição dos cientistas. Os mais conservadores defendiam o método da hora local por ser o mais preciso. Outros admitiam as convenções de Greenwich desde que fossem obedecidos todos os seus parâmetros. Foram evocados, principalmente, problemas de saúde. Os debates no Congresso, entretanto, foram amenizados pela maioria governista e pelo consenso estabelecido entre os políticos todos agraciados com o que poderia ser considerada uma unificação da hora oficial, levando em conta que mais de 90% da população ficara com o mesmo horário, mesmo não estando necessariamente no mesmo fuso.
Hoje as restrições à mudança localiza-se em alguns setores da classe médica receosa de que a mudança possa afetar a saúde das pessoas e alguns geógrafos apegados a uma espécie de cientificismo, exatamente o que os introdutores de Greenwich tentaram evitar, flexibilizando a aplicação dos meridianos, de modo que cada país tivesse o seu próprio horário sem, obrigatoriamente, fatiar seu território. A China, por exemplo, apesar do quatro fusos adotou horário único para todo o país, a hora de Pequim. O Brasil, com três (um para as ilhas oceânicas e dois para o território) está perfeitamente enquadrado nos parâmetros de Greenwich.
A oposição tenta sensibilizar a classe trabalhadora com o argumento de que uma hora a menos vai obriga-la a iniciar suas atividades ainda na escuridão, o mesmo acontecendo com as crianças que estudam no período da manhã, forçadas a madrugar para chegar ao colégio as 8 horas, o que não deixa de ser um exagero, contando que a diferença entre a capital paulista e Campo Grande, por exemplo, não passa de 36 minutos.

QUEM QUER

Os defensores da mudança para Mato Grosso e Mato Grosso do Sul querem apenas a adaptação à realidade brasileira, atualizada com a recente lei que alterou a hora no Oeste do Pará, integrando-o à hora legal de Brasília. Estes estados quanto à longitude estão na mesma situação da região incorporada. Jacareacanga no Pará, Cáceres em Mato Grosso e Corumbá em Mato Grosso do Sul estão localizadas no meridiano 57º, logo, se faltava referência geográfica, a extinção do quarto horário revoga o ciclo de objeções técnicas e científicas.
Busca-se satisfazer interesses econômicos não apenas de banqueiros e redes de televisão, aparentemente, os mais prejudicados com a manutenção da hora atual. Fazemos parte de uma comunidade que deve agir em sintonia. Se em 1913 estávamos na periferia desta tribo, hoje estamos totalmente integrados ao Sul e ao Sudeste, onde compramos, vendemos e mantemos nossas relações mais freqüentes, explicando a adesão ao movimento, da Federação das Indústrias de Mato Grosso do Sul e Associação Comercial de Campo Grande e das tvs Morena e Centro América, afiliadas da Globo em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso respectivamente. O custo desta hora de atraso é enorme. E não apenas o custo para a economia regional, que perde em competitividade, geração de mais empregos e na concorrência de mercado, mas também em informação e lazer, caso da mudança na programação das redes de televisão, prejuízo igualmente rateado entre os telespectadores.

Se a distância entre Mato Grosso do Sul e os principais centros civilizados do país foi ultrapassada pela velocidade do transporte e da informação. Se a diferença horária entre São Paulo e Corumbá não chega a uma hora. Se o Observatório Nacional não veta a proposta. Se a exemplo do que ocorre no Norte e Nordeste for suprimido o horário de verão para este Estado. Se a mudança vai integrar nosso Estado às regiões mais adiantadas do país e, considerando que o impacto para a saúde da população pode ocorrer apenas na fase de adaptação ao novo horário, realmente não há o que temer. O novo horário será um pacto de Mato Grosso do Sul com o seu futuro.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Enervâncias

VELHAS NOVIDADES

O sino da capela acorda a cidade grande, o pequeno detalhe faz a diferença, a semelhança é mera coincidência, a premeditação é agravante, a atenuante é a melhor defesa, ataque é destreza, inaptidão também é natural, artifício não dá certo, errar é desumano, humano raciocina por instinto, a razão desconhece o difícil, o fácil não fascina, indiferença não mata, vida mansa não cansa, repouso relaxa, tensão não dá lucro, prejuízo não tem consolo, desgosto estraga prazer, desagrado desanima, entusiasmo é vitória, derrota é passageira, permanente permanece, insubsistente não justifica, injustificável não explica, o insondável não se enxerga, a cegueira é escuridão, o clarão mostra o caminho, o descaminho leva à ruína, a fortuna é o futuro, o passado é pesadelo, o sonho alimenta a alma, o corpo é só matéria, o intangível também existe, inexiste o inatingível, o acessível é permitido, proibido pisar nas flores, espinhos não ferem ferro, brasa não queima n’água, terra fértil é fecundante, aridez faz o deserto, oásis o paraíso, inferno purga os pecados, virtudes premiam méritos, desmerecimento não compensa, descompensado não pensa, insensatez desmerece, valores diferenciam, análogos banalizam, o invulgar acontece, fracassa aquele que pára, anda e desanda a mentira, a verdade dói, cura o melhor remédio, o inevitável ocorre, desaparece o covarde, valente é o que não perde, vencer é desafio, conciliação é medo, coragem é força bruta, artimanha alavanca, debilidade desbanda, une o interesse comum, rareia a solidariedade, o individualismo avança, recua a civilidade, truculência prolifera, contrai-se a mão da justiça, iniqüidade se sanciona, veta-se o moralizante, a devassidão devasta, preserva-se a impudência, recata-se o bom exemplo. Nada muda impunemente.

domingo, 11 de maio de 2008

Observâncias

DEFEITOS DESFEITOS

Nem tudo é perfeito, o defeito é apenas um detalhe, o encalhe é sobra do que foi lido, a libido não e mais que um desejo, o ensejo nem sempre é a melhor oportunidade, a maldade é o momento, o cimento é pouco sem a pedra, a cerda não limpa sem a água, a mágoa é uma mera emoção, a razão desconhece as razões, as sezões são mal estar passageiro, o dinheiro vale quanto pesa, a presa escapa ao predador, o falador cala ante a verdade, a vaidade se esvai com as rugas, a fuga não alivia, a franquia não isenta, a tormenta é efêmera, a cegueira não dá só na vista, a pista pode ser falsa, a alça é fraca, a faca é cega, a regra tem exceção, a sessão está encerrada, a estrada interrompida, a ferida cicatrizada, a boiada no piquete, sem soquete não há luz, a cruz fecha os braços, o abraço não comprime, o stream desconecta, a infecta não contamina, a vitamina não sustenta, a ementa não minucia, agonia não é morte, o forte é vulnerável, o instável se recobra, desdobra-se o limitado, só o culpado tem perdão, aluvião não represa, surpresas são esperadas, porradas não convencem, vencem os que esperam, oneram os perdedores, flores que não frutificam, ficam pra trás os cansados, usado se descarta, falta se justifica, multiplica-se o juro, o puro é maculado, mascarado mostra a cara, vara não faz magia, o dia metade é noite, açoite não regenera, a peneira só separa, cara feia não assusta, justa causa não compensa, recompensa desagrada, tabuada não faz conta, ponta de areia é praia, a vaia não desabona, dipirona não desinflama, clama uma voz no deserto, mesmo perto inda é distante, tolerante não releva, as trevas têm claridade, saudade não mata gente, a enchente fertiliza, ojeriza não engorda, a horda é disciplinada, nada é imperfeito.

sábado, 3 de maio de 2008

Absorvências

ABSORVIDO ABSOLVIDO

Nada é descartável, o inflável é deprimido, o ruído é abafado, o calado é ouvido, o ouvido é mouco, o pouco é bastante, o instante é o momento, o tormento é tolerável, o instável é sólido, o bólido está imóvel, o móvel é inservível, o ser vivo é cataplético, o cético é crente, o demente está lúcido, o plácido se agita, regurgita o esfaimado, o domado não obedece, a prece não faz milagre, o bagre não ferroa, a garoa é quente, a frente é fria, a via é vã, a van voa, a loa elege, o bege brilha, a trilha atalha, a falha é perfeita, a receita é falha, a malha é quadrada, a fada é falsa, a calça é frouxa, a tocha apaga, a carga é leve, o breve dura, a cura mata, a mata assombra, a sombra aclara, a cara espanta, a santa peca, a meca dispersa, a conversa destoa, a broa alimenta, a menta não arde, o alarde não soa, ecoa a mudez, a nudez veste, a peste é benigna, maligna é a saúde, o ataúde é um berço, o terço é uma missa, a cortiça não veda, a queda não quebra, não medra o covarde, o tarde é cedo, o medo encoraja, a tarja não marca, a faca não corta, a porta não abre, o sabre não perfura, a candura não é pura, a doçura é adstringente, o inocente paga, a saga é cega, a regra não altera, a fera nem sempre ataca, a vaca não dá leite, o azeite não tempera, a tapera tem carpete, o topete às vezes baixa, a caixa está vazia, a mania não pega, o colega dedura, a estrutura cede, a sede sacia, a alegria entristece, a messe não abunda, a bunda não mais fascina, a sina não sinaliza, a camisa não veste, a peste não contamina, a propina é recusada, a acusada confessa, a peça não espana, a cana é azeda, a seda é abrasiva, a saliva não umedece, emudece a voz da razão, a canção não embala, a fala não convence, o nonsense não é grotesco, o pitoresco não se pinta, a tinta está deixando de escrever.